14.10.04
???
Na sexta à noite havia decidido como seria seu fim-de-semana. Sábado acordaria bem cedinho e iria direto para a concessionária. Já estava tudo planejado, ele já tinha visitado a loja, escolhido o modelo do carro, feito o test-drive, escolhido a cor, os opcionais, as formas de pagamento, tudo. Só faltava consumar o ato.
Quando foi para a cama na sexta, ainda não acreditava que finalmente iria comprar seu primeiro carro. Havia trabalhado incansavelmente por três longos anos, feito infindáveis horas extras, retirado de sua renda mensal apenas o mínimo necessário à sua modesta sobrevivência, aplicado o resto na poupança. Após mais andar a pé que de ônibus, finalmente teria a chance de rodar com seu novo carro pelas ruas da cidade tão apinhada deles. Mas o seu teria catalisador, nem poluiria tanto.
Sabia que seu carro iria causar inveja na vizinhança, nos pedestres, nos outros motoristas e em todos. Sabia que seu novo carro atrairia belíssimos exemplares do sexo oposto. Sabia que, mesmo sendo interesseiras, as tais marias gasolina lhe trariam grandes vantagens impublicáveis.
Finalmente o despertador tocou – sete e meia da manhã – e o despertou de um lindo sonho em que desfilava com seu magnânimo carro. Saltou da cama, escovou os dentes e o cabelo rapidamente, engoliu uma xícara de café e voou para a concessionária. Queria ser o primeiro cliente a chegar, não queria correr o risco de nenhum espertinho tomar-lhe a frente e comprar seu precioso carrinho. Para isso, deu-se até mesmo ao luxo de tomar um táxi. Além da pressa, queria acostumar-se à idéia de chegar de carro nos lugares. Acostumar-se ao status.
De fato foi o primeiro a chegar à loja. Quando entrou, os vendedores, mecânicos e gerentes mal haviam entrado e ainda tomavam seu cafezinho matinal. Aguardou impacientemente pelo final do improvisado desjejum coletivo antes de poder mostrar seu interesse na compra de um automóvel.
Já sabia como seria seu carro: quatro portas, motor turbo, ar-condicionado, direção hidráulica, freios ABS, rodas de liga leve, conversível, preto – do jeito que Ford afirmava que deviam ser os carros – e, obviamente, com bancos de couro. Sabia que pagaria caro por isso. Por esse inigualável possante. Por isso havia trabalhado tanto por tanto tempo.
Ao sair da loja, já guiando sua caranga irada, como gostava de referir-se ao carro, resolveu experimentar, na primeira grande via que se descortinou à sua vista, o grande motor do carro. De fato, era um ótimo motor, com potência irrepreensível.
Parou num farol vermelho. Sorriu infinitamente feliz e só lastimava o fato de a apólice do seguro não estar ainda em suas mãos, demoraria duas semanas para sair. Quando o farol abriu, saiu cantando pneus e não teve nem ao menos tempo de ver o caminhão sem freios que vinha na pista transversal, furando o farol. Ele nada sofreu na batida. Sofreu – e sofreu muito – apenas quando o policial lhe disse:
-Pois é, dotô, deu petê. Tinha seguro?
Quando foi para a cama na sexta, ainda não acreditava que finalmente iria comprar seu primeiro carro. Havia trabalhado incansavelmente por três longos anos, feito infindáveis horas extras, retirado de sua renda mensal apenas o mínimo necessário à sua modesta sobrevivência, aplicado o resto na poupança. Após mais andar a pé que de ônibus, finalmente teria a chance de rodar com seu novo carro pelas ruas da cidade tão apinhada deles. Mas o seu teria catalisador, nem poluiria tanto.
Sabia que seu carro iria causar inveja na vizinhança, nos pedestres, nos outros motoristas e em todos. Sabia que seu novo carro atrairia belíssimos exemplares do sexo oposto. Sabia que, mesmo sendo interesseiras, as tais marias gasolina lhe trariam grandes vantagens impublicáveis.
Finalmente o despertador tocou – sete e meia da manhã – e o despertou de um lindo sonho em que desfilava com seu magnânimo carro. Saltou da cama, escovou os dentes e o cabelo rapidamente, engoliu uma xícara de café e voou para a concessionária. Queria ser o primeiro cliente a chegar, não queria correr o risco de nenhum espertinho tomar-lhe a frente e comprar seu precioso carrinho. Para isso, deu-se até mesmo ao luxo de tomar um táxi. Além da pressa, queria acostumar-se à idéia de chegar de carro nos lugares. Acostumar-se ao status.
De fato foi o primeiro a chegar à loja. Quando entrou, os vendedores, mecânicos e gerentes mal haviam entrado e ainda tomavam seu cafezinho matinal. Aguardou impacientemente pelo final do improvisado desjejum coletivo antes de poder mostrar seu interesse na compra de um automóvel.
Já sabia como seria seu carro: quatro portas, motor turbo, ar-condicionado, direção hidráulica, freios ABS, rodas de liga leve, conversível, preto – do jeito que Ford afirmava que deviam ser os carros – e, obviamente, com bancos de couro. Sabia que pagaria caro por isso. Por esse inigualável possante. Por isso havia trabalhado tanto por tanto tempo.
Ao sair da loja, já guiando sua caranga irada, como gostava de referir-se ao carro, resolveu experimentar, na primeira grande via que se descortinou à sua vista, o grande motor do carro. De fato, era um ótimo motor, com potência irrepreensível.
Parou num farol vermelho. Sorriu infinitamente feliz e só lastimava o fato de a apólice do seguro não estar ainda em suas mãos, demoraria duas semanas para sair. Quando o farol abriu, saiu cantando pneus e não teve nem ao menos tempo de ver o caminhão sem freios que vinha na pista transversal, furando o farol. Ele nada sofreu na batida. Sofreu – e sofreu muito – apenas quando o policial lhe disse:
-Pois é, dotô, deu petê. Tinha seguro?