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6.8.04

Apropriação indébita 


Texto de Furio Lonza publicado na Fraude:

Blog
Quem não tem teto de vidro usa óculos escuros, por Furio Lonza


[ 06/08/2004 ] Como o próprio nome diz, o BLOG é uma espécie de vômito, uma elucubração visceral que cava fundo e tira do mais íntimo do ser as mais recônditas idiossincrasias do jovem escritor em potencial, é um corte cirúrgico & embriônico, um mantra caseiro que ressalta no dia a dia a escala de valores intestina que todos nós gostaríamos de aflorar. Nesses portais para iniciados, com um teclado na mão & algumas idéias na cabeça, o autor se desnuda em textos fragmentários e quase sem enredo aparente.

Antes, essas confissões só estavam acessíveis a um pequeno e seleto grupo de membros pertencentes a enrustidas confrarias e principalmente aos vizinhos de mesas de bar; hoje, com o advento da tecnologia de ponta, que socializou essas informações via Web, todos podem se regalar com as tiradas & sacadas geniais dos autores de BLOGS. Enganam-se, porém, os que acham serem essas agendas cibernéticas simples altares do Ego, elas representam a mais pura democracia a serviço do comunismo de idéias e da reflexão.

WALK ON THE WILD SIDE


Nesses redutos individuais, podemos depreender, assim, na mais pura casualidade, que os autores são sempre outsiders: bebem, fumam, vomitam, ouvem música, dormem tarde, trepam muito, compram livros e CDs em sebos, criticam, se expõem, se abrem, citam, extrapolam, reverenciam, são transgressivos, possuem uma falta de apego crônico e ácido em relação a bens materiais. Os homens são durões & amorais; as mulheres são duronas & amorais. Não são sociáveis, fazem tábula rasa dos conceitos pré estabelecidos, adoram botecos e lambanças generalizadas, vivem nas baladas, são referenciais, detestam estereótipos, poderiam ser rotulados de neo-naturalistas pós-modernos. Mas eles detestam rótulos.

Em geral, os BLOGGERS estabeleceram seu quartel general em São Paulo ou Rio de Janeiro, assim, na maior casualidade, não porque pretendam ganhar dinheiro ou serem reconhecidos nas ruas, pois eles não têm o menor ranço de vaidade, mas pelo simples fato de que as metrópoles ainda exercem um certo fascínio, um brilho. Em seus locais de origem, jamais poderiam ousar com tanta desenvoltura: lá, eles sempre foram vistos com certa cautela pelas hostes mais conservadoras justamente pelas idéias libertárias que brandiam nas rodinhas, pois são cidades muito provincianas, cristalizadas em preconceitos milenares.

E eles sabem o que querem: é difícil encontrar um autor de BLOG que não goste de Keith Harring, Tom Waits, Tarantino, Stooges, Will Eisner, Patti Smith, John Fante, Morphine, Allan Sieber. Ficamos sabendo assim, na maior casualidade, de seus gostos particulares, de suas intempéries etílicas, de suas rebordosas, de suas proezas sexuais, dia a dia, homeopaticamente, pois inclusive são feitos em forma de diário. Exemplo: “2 de agosto de 2004. Acordei com dor de cabeça. Botei um bootleg do Maluco Beleza na vitrola, pois ainda gosto de vinil. Procurei o potinho de bicarbonato na despensa, mas não encontrei. Despejei um denso suco de tomate que demorou uma eternidade para sedimentar-se no copo e não dei a menor bola para aquele bando de ovelhas que vinham da cozinha em minha direção. Aquele pôster alucinógeno da parede da sala me proporcionou a primeira ânsia de vômito do dia. Aquilo me deixou bem claro o que eu vinha imaginando: a pizza do dia anterior estava estragada”. Tipo assim.

COME AS YOU ARE


Na maior calma, o autor moderno de BLOG se coloca de corpo inteiro, fala de suas preferências, ficamos sabendo como ele pensa, o que evita, sua filosofia de vida sempre extrapola o bom senso, pois, como se sabe, o exagero é a principal característica de uma vida nômade e ébria. Ele deixa claro que é contra alguma coisa. Ou todas as coisas. Eles são o que são. Para os BLOGGERS, Literatura & Vida são faces da mesma moeda, se imbricam de tal maneira que fica difícil, muito difícil separá-las, como em Rimbaud. Poesia, uísque, cerveja, sexo, sarcasmo, bandas de rock, jazz, maconha, insatisfação, piadas, tequila, vagabundagem, cu, pau, porra, menstruação, boquetes, mundo pop, irreverência, comida trash, sarjetas que fedem a bourbon barato, seriados antigos de TV, minas bêbadas, fodões & bundões, quadrinhos, vizinhas peladas no chuveiro, violência, anarquia, cigarro. Tudo é mote. Tudo é motivo. Tudo é tema. Parecem cavernosos personagens saídos de um roman noir americano da década de 40.

O fascinante nos BLOGS reside justamente nisso: eles revitalizam os valores simples, as pequenas coisas do cotidiano, reestruturam um minimalismo perdido, criam exercícios de imaginação existencial que transcendem as parcas regras de conduta da sociedade imediatista, resgatam uma vida de ascetismo puro, genuíno e transparente. É o regresso à anima arquetípica universal.

THE FIRT CUT IS THE DEEPEST

Mas aí, aconteceu, todos se lembram. Foi por volta de 2000 e pouco: aquele vírus talibã atacou todos os computadores do mundo, embaralhou os sites, os e-mails, os portais & os BLOGS, trechos de um foram parar em outro, os nomes dos BLOGGERS se confundiram, poemas e mini contos ficaram no limbo, textos órfãos sofreram simbioses e corruptelas, opiniões foram retalhadas e se amalgamaram; o que era crítica virou elogio, citações perderam as aspas, quem gostava de Kurt Weill passou a enaltecer Karen Carpenter, tremendas fodas transgressivas eram sublinhadas pela trilha sonora de Supertramp, quem citava John Cassavetes na maior casualidade passou a se referir com o maior respeito a Friends.

A ação dos hackers foi impiedosa. Atacaram na fonte. O tumulto se generalizou nos bunkers niilistas, não houve antispam que resolvesse o fuzuê. Mas ninguém percebeu, os jornais não comentaram; leitores, curiosos, fãs e creenagers aficionados continuaram a ler os BLOGS como se nada tivesse acontecido. Dado o fato como consumado, os autores pararam de espernear e silenciaram sobre o fenômeno. Afinal, o importante eram as idéias e não a autoria, as opiniões nos BLOGS eram semelhantes, as referências, parecidas. E isso foi o mais bonito de tudo: o despojamento total, uma ode ao anonimato. Sem o menor traço de presunção ou soberba, todos passaram a escrever para os BLOGS dos outros e assinando coisas que não eram suas, como num ensandecido revival dadaísta.

ALL ALONG ON THE WATCHTOWER

Duas semanas depois, contudo, deu-se a segunda reviravolta: agastados pela mesmice, os autores se deram conta da ingenuidade desses textos coletivos pois, como se sabe, nada melhor do que encampar BLOGS dos outros para que a luz de alerta se acenda. E passaram a ler Dostoiévski e Camus para adensar a trama; procuraram em Flaubert uma maneira de aprimorar a técnica ficcional; Balzac e Stendhal vieram em auxílio no sentido de verticalizar a psicologia dos personagens. As BLOGGEIRAS começaram a se interessar por Carson McCullers, Elizabeth Browning, Edith Wharton e Sylvia Plath para explorar fundo a alma feminina e sofisticar a dicotomia entre determinação & ousadia. A análise dos prazeres e desventuras da vida cotidiana alcançou um patamar jamais imaginado, alimentando um traumatismo no ambiente físico.

Novas formas romanescas criaram vertentes sólidas, o ceticismo deu lugar a críticas embasadas em conceitos e perspectivas, o prosaico ganhou tons do verdadeiro horror por trás da face atraente das coisas. Os autores dividiram-se em categorias: havia os que se embrenhavam na baixeza moral do coração humano; havia os que exploravam os símbolos da alienação do homem no universo hostil; proliferaram autores de alta sensibilidade e lirismo que derivaram em metáforas de solidariedade e humanismo; os estilos bifurcaram-se: havia desilusão & angústia, mas havia também altos momentos de virtuosismo, sonhos, esperanças e alegria.

A partir daí, a literatura brasileira, buscando inclusive suas raízes, floresceu, inundou as livrarias, novos leitores surgiram e eclodiu um novo boom. Hoje, ela voltou a ser respeitada, foi traduzida no estrangeiro e, como todos sabem, ganhamos enfim o tão sonhado Prêmio Nobel.

GOOD TIMES. BAD TIMES

Só mais recentemente, no intuito de renovar a postura, revitalizar os valores simples, reestruturar o minimalismo perdido, resgatar uma vida de ascetismo puro e regressar à anima arquetípica universal, é que surgiram jovens escritores em potencial que voltaram a fazer BLOGS. Em textos fragmentários e quase sem enredo aparente, eles exploram o prosaico do cotidiano em diários cibernéticos, onde bebem, fumam, comem pizzas estragadas, vomitam, trepam muito. Tem uísque, tem cerveja, tem sarcasmo, bandas de rock, jazz, maconha, insatisfação, piadas, tequila, vagabundagem, cu, pau, porra, menstruação, boquetes, mundo pop, irreverência, comida trash, sarjetas que fedem a bourbon barato, seriados antigos de TV, minas bêbadas, fodões & cuzões, quadrinhos, vizinhas peladas no chuveiro, violência, anarquia, cigarro.

FRASE DA SEMANA

O intelectual brasileiro é uma tênia sólium nas entranhas de uma anoréxica.

MÚSICA DA SEMANA

Vestiu a carapuça listrada e saiu por aí
Em vez de continuar dando porrada,
Ele foi pra Feira do Livro de Paraty.

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Furio Lonza é escritor, autor de As Mil Taturanas Douradas - com ilustrações de Angeli - entre outros livros.

sACal
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LegAL
ooooo
000
OOOOO
bmw placa bmw
001
piada
ouro
002
sarcasmo
frenar
003
irreverência
dourado
004
cerveja
swarowsky
005
gonzo
light
006
sexo
hipocrisia
007
ruído
silicone
008
magrelas
assepsia
009
objetos promocionais
publicidade
010
ironia
celebridade
011
coleções
indecisão
012
bong
cagüetagem
013
silêncio
caga-regrice
014
bolachas de chope
maniqueísmo
015
contradição
lentidão
016
fogo
conteúdo pago
017
imdb
marketing
018
gibi
beterraba
019
coxinha
autoritarismo
020
subversão
burrice
021
objetos etílicos
a polícia
022
the police
reality show
023
ímãs de geladeira
veadinhos
024
porquinhos
03 pês
025
03 bês
enlatado
026
música
rotina
027
férias
comedimento
028
palavrão
analfabetismo
029
trema e circunflexo
sem texto
030
contexto
responsável
031
vagabundo
sol
032
sombra
comida congelada
033
larica
ética
034
estética
estética
035
ética
hierarquia
036
insubordinação
direita
037
esquerda
absoluto
038
relativo
verdade
039
mentira
súbito
040
subtil
certo
041
erado
imitação
042
verossimilhança
insetos
043
lagartixas
canibais
044
canabis
tucanos
045
qualquer coisa
especulação
046
ocupação
rigor
047
vigor
barbaridades
048
barbarismos
royalties
049
domínio público
banho
050
banheira
boa idéia
051
cachaça de verdade
micro$oft
052
software livre
evangelização
053
ejaculação
convencional
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experimental
quente
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frio
paróquia
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paródia
dicotomia
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pluralidade
cópia
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plágio
hímen
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hífen
monarca
060
menarca
camisinha
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pílula
o normal
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anormal
esotérico
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exótico
hesitar
064
exitar
chuvão
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chavão
hesitação
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exaltação
puritano
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putanheiro
remédios
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depressão
erótico
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pornô
indies
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índios
desafio
071
desafino
trauma
072
trema
kurt cobain
073
dave grohl
drogas
074
entorpecentes
o dia todo
075
todo dia
i
111
I
zz
222
ZZ
incenso
420
marofa
sssss
555
SSSSS
dEus
666
diAbo
colírio
743
óculos escuros
zu3b
999
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MAS
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