26.2.04
Herança
CALA A BOCA! Não tem nada a ver o que você tá dizendo! Não! Não é isso, você tá viajando! Será que você pode me escutar pelo menos um pouco? Caralho, deixa eu falar.
Peraí, deixa eu falar... Deixa eu falar. Deixa eu falar. Deixa eu falar! Deixa eu falar, porra! CARALHO, DEIXA EU FALAR, PORRA!!!!! CALA A BOCA!!!!
(Momentos decisivos: ela corre pra fora do quarto, ele a persegue e, enquanto puxa os cableos dela, a empurra da escada -sem soltar seus cabelos, claro.)
Filha da puta...
(Solta os cabelos, limpa o suor da testa e volta pro quarto, ainda em tempo de ver na tevê uma matéria sobre um matricida. Revoltado, pensou em sua mãe. E em seu pai, que embora não fosse um matricida, matou a mãe do próprio filho, o que, no final, fazia dele um matricida indireto, talvez...)
Mamãe...
(E, sem esquecer do corpo inerte no fim da escada, desligou a tevê e, pela última vez no dia, culpou seu pai por ser como era.)