17.2.04
Demônios da noite
Ela fazia uns barulhos muito estranhos quando dormia. Parecia que brigava, que xingava, que reclamava, que batia -e apanhava-, que cuspia... cada um com seus demônios.
Eu tinha chegado mais tarde, teve uma balada num bar por aí, acho que ali pela Paulista. Fato que não, foi antes, no Paraíso. Enfim, cheguei tarde. Ela já estava dormindo. Mas eu estava bêbado demais, acabei dormindo na sala. Ela estava no quarto em frente, dormindo com a porta entreaberta, a luz do banheiro acesa. Roncava um pouco; mas acho que, nesse caso, se chama ressonar...
Deitei, de roupa mesmo, no sofá e, enquanto esperava o teto parar de girar, comecei a ouvir barulhos estranhos. Eram os tais barulhos. Os que ela faz. Primeiro eu achei que fosse da minha bebedeira, mas era nítido demais. Era ela mesmo. Resmungava, xingava -quer dizer, qualquer nota, eram só barulhos, o tom era de xingamento.
Ela nunca foi uma pessoa pacífica... a convivência com ela nunca foi das mais fáceis. Ela é muito geniosa. Invejosa. Mal amada: mal comida. Não sei como ela lidou com aquele aborto, nunca falamos sobre isso. Ela está sempre reclamando, desdenha demais das coisas e é incapaz de um sentimento -mínimo, que seja- de gratidão.
É uma pessoa perturbada. A irmã que não casou, que não teve filhos ou netos. Que foi abandonada por uns dois noivos, que não conseguiu casar, ninguém agüentava. Aí, ficou velha e dependente (e esse é justamente sua maior indignação) e foi morar com um sobrinho.
Eu tinha chegado mais tarde, teve uma balada num bar por aí, acho que ali pela Paulista. Fato que não, foi antes, no Paraíso. Enfim, cheguei tarde. Ela já estava dormindo. Mas eu estava bêbado demais, acabei dormindo na sala. Ela estava no quarto em frente, dormindo com a porta entreaberta, a luz do banheiro acesa. Roncava um pouco; mas acho que, nesse caso, se chama ressonar...
Deitei, de roupa mesmo, no sofá e, enquanto esperava o teto parar de girar, comecei a ouvir barulhos estranhos. Eram os tais barulhos. Os que ela faz. Primeiro eu achei que fosse da minha bebedeira, mas era nítido demais. Era ela mesmo. Resmungava, xingava -quer dizer, qualquer nota, eram só barulhos, o tom era de xingamento.
Ela nunca foi uma pessoa pacífica... a convivência com ela nunca foi das mais fáceis. Ela é muito geniosa. Invejosa. Mal amada: mal comida. Não sei como ela lidou com aquele aborto, nunca falamos sobre isso. Ela está sempre reclamando, desdenha demais das coisas e é incapaz de um sentimento -mínimo, que seja- de gratidão.
É uma pessoa perturbada. A irmã que não casou, que não teve filhos ou netos. Que foi abandonada por uns dois noivos, que não conseguiu casar, ninguém agüentava. Aí, ficou velha e dependente (e esse é justamente sua maior indignação) e foi morar com um sobrinho.